domingo, 25 de julho de 2010

Me reinvento a cada noite de insônia
Desfaço os planos inalcançáveis
Me reviro por entre travesseiros e desejos
Imagino-me, mendigo, maltrapilho, maldito
Gritando em praça pública à multidão anônima

Amo os amigos eternos
Que conheci há menos de um minuto
Amo-os, pois deixe-os sempre

Tenho saudades das pessoas que não conheci
Serão sempre interessantes possibilidades

Extraio de minhas vísceras os mais estranhos versos
Um mosaico de lembranças do que não fui
Enfeito-o com flores negras
E talho-as sobre o alheio mausoléu

Quando eu morrer
Enterre comigo meu Álvaro de campos
Meu Bernardo Soares
Quero que minha carcaça se misture
Aos seus versos
E juntos, devorados por vermes
Misturaremos-nos à terra escura

Chamem um padre
Para que no último segundo
Em que a luz tocar minha pele fria
Eu posso sorrir ante suas sandices
Sorrir, quando eu não estiver, ou quando realmente estiver

(...) morto?
Menos morto do que tantos que conheci
Mas, enquanto o dia do Nada não chega

Reparto-me e ofereço numa paupérrima bandeja
Todo o meu estar desperto neste indigesto existir
Ahhhh, como me causam náuseas estes autênticos pré-fabricados
Fedendo a livros, recitando com ar lânguido aquilo que não sentem

E esta torpe sensação
O sol rasgando minha pele
Como um varão
desvirginando o corpo ingênuo indefeso
... e me arrebento no fatídico verso
rebento abandonado ao nascer

Menos!
Menos qualquer coisa que pretenda ser mais
do que realmente é...
Menos!
dessa ânsia infame de querer ajudar para sentir-se confortável
e limpo sentado à mesa farta
Menos!
Menos desta vontade plástica
de manter-se jovem sendo a alma flácida
menos, menos desta, e de toda farsa

que não se expele em arte
sobre esta vida trágica.